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Caros Amigos.
O nosso Poeta nasceu hoje 16 de Agosto de 1867.
O Poeta que construiu um castelo de fantasia na praia da da Boa Nova.
Um pouco da sua história.
António Nobre em Leça
Relativamente a este poeta, podemos começar por afirmar que, se não tem sido um êxito de crítica, o público português tem-lhe manifestado um enorme carinho, bem patente no facto de ser um autor celebrado pelas terras por onde passou, estando a sua memória dividida pelo Porto natal, pela Coimbra académica e pela Leça estival. Todos reclamam a sua porção de Nobre.
Esta popularidade não se deverá, necessariamente, à qualidade da sua escrita, questão discutível de gosto, mas sim, por exemplo, à simplicidade da sua obra, à empatia lusa com alguma lamechice melancólica contida nos seus versos ou à facilidade de retratar o povo nas suas misérias e alegrias.
Tudo isso, no entanto, está relacionado com o tom confessional de uma poesia em que se torna difícil distinguir o homem do poeta, a vida da poesia. Aliás, mesmo Albino Forjaz de Sampaio, um detractor da obra nobreana, afirma que “Só” é “um livro pessoal, uma autobiografia, um desabafo em verso (…)”. O cruzamento entre cartas e poemas de Nobre parece confirmar esta afirmação. Assim, podemos, por momentos, esquecer a prudência que nos obriga a desconfiar que à palavra poética possa estar associado um fingimento insíncero.
Para além disso, outros testemunhos, nomeadamente de Alberto Oliveira e de Augusto Nobre, ajudam-nos a entrever os dias leceiros de António Nobre.
Se começarmos pela obra, basta ler o célebre “Lusitânia no Bairro Latino” para descobrir uma acumulação enternecida de topónimos e antropónimos relacionados com Leça da Palmeira. Se tivermos em conta que o texto foi escrito em Paris, descortinamos uma nostalgia mais que poética. Neste texto, Nobre convoca as suas recordações, fazendo referência ao Cabo do Mundo, à ermida da Boa Nova, ao forte de Leça ou à água da Amorosa, enquanto chama pela “Bruxa do Padre”, antiga criada de um clérigo, ou pelo “Arrabalde”, o Zé Rabalde, embarcadiço reformado que alugava a casa aos banhistas.
Noutro lugar, afirma o poeta: “(…) é em Leça a terra onde… tenho educado a minha alma, onde estão ligadas todas as boas recordações da minha vida.” Efectivamente, até o “Anto” com que se identifica muitas vezes terá tido origem aqui, através de Charlotte, uma inglesinha por quem esteve enamorado.
De resto, sabemos, por intermédio de seu irmão Augusto, que o autor do “livro mais triste que há” levava, em Leça, uma vida despreocupada, integrando um grupo de rapazes que se entretinha, entre outras coisas, a tocar os sinos para arreliar o sacristão da capela de Santa Catarina, fugindo depois para a praia. Podemos vislumbrar escândalos maiores quando na “Carta a Manuel” o escritor lembra os “banhos em pelote/Quando íamos nadar, à Ponte de Tavares!”: talvez estejamos na presença de um precursor do nudismo em Portugal.
Leça terá sido, efectivamente, uma ilha na existência sofrida de Anto, tal como ele próprio reconhece no soneto em que afirma ter edificado um castelo de fantasia na praia da Boa Nova, situado num condado que poderemos identificar com a infância, já que o poeta afiança ter sido um “poderoso conde/Naquela idade em que se é conde assim…”
Efectivamente, entre Leça e Nobre deu-se um casamento feliz: a terra constituiu fonte de inspiração para o poeta, recreio para o homem.
Por: Fernando Nabais